Arq. Bras. Cardiol. 2025; 122(4): e20250251

Existe um Tamanho Único para Todos? – Refinando a Terapia Anticoagulante Parenteral de Acordo com o Peso Corporal

Remo Holanda de Mendonça Furtado ORCID logo

DOI: 10.36660/abc.20250251

Este Minieditorial é referido pelo Artigo de Pesquisa "Influência da Obesidade na Segurança e Eficácia do Tratamento Antitrombótico: Uma Revisão Sistemática e Metanálise".

Os anticoagulantes parenterais são medicamentos amplamente utilizados na medicina. Em síndromes coronárias agudas (SCA), o uso de heparina não fracionada intravenosa (HNF) tem sido amplamente substituído por heparinas de baixo peso molecular (HBPM) devido à facilidade de administração, ao efeito mais previsível e à eficácia superior destas últimas em pacientes com infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST submetidos à fibrinólise. As diretrizes atuais recomendam a anticoagulação com enoxaparina (classe I) em uma ampla gama de pacientes com SCA., No entanto, uma das principais limitações da HBPM continua sendo seu uso em pacientes com extremos de peso corporal. Alguns estudos sugerem uma anticoagulação menos confiável entre pacientes com peso superior a 100 kg ou com índice de massa corporal (IMC) acima de 40 kg/m². Ainda é controverso se a dose de 1 mg/kg a cada 12 horas para anticoagulação terapêutica deve ser mantida em pacientes extremamente obesos., Atualmente, a bula brasileira da enoxaparina recomenda uma dose máxima de 100 mg a cada 12 horas, com ajustes posológicos adicionais para pacientes com mais de 75 anos e aqueles com disfunção renal moderada a grave.

A edição atual dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia traz uma importante metanálise que pode ajudar, em parte, a esclarecer essas questões. Os autores realizaram uma revisão sistemática de estudos envolvendo pacientes em tratamento para diversas condições, a maioria (87%) para SCA, com anticoagulante parenteral (HNF, enoxaparina ou fondaparinux). Os estudos elegíveis compararam dois grupos de exposição (obesos versus não obesos, sendo obesos definidos como IMC ≥ 30 kg/m²) em termos de desfechos de morte e sangramento. Como poucos estudos relataram desfechos de infarto do miocárdio e nenhum analisou acidente vascular cerebral, esses desfechos não fizeram parte da metanálise atual. Os autores encontraram 6 estudos, três deles análises secundárias de ensaios clínicos randomizados (ECR) e três estudos de coorte retrospectivos. As taxas de sangramento não diferiram de acordo com a presença de obesidade (sem heterogeneidade aparente de acordo com HNF versus HBPM). No entanto, a obesidade foi associada à menor mortalidade em anticoagulação parenteral. Esta última descoberta não é totalmente surpreendente, visto que já foi demonstrada antes (o chamado “paradoxo da obesidade”). Os pontos fortes da metanálise atual foram a seleção rigorosa de estudos em diferentes bases de dados, a avaliação do risco de viés e a heterogeneidade das estimativas com métodos adequados. A principal limitação foi que, embora ECRs tenham sido incluídos, a informação essencial, ou seja, a comparação entre pacientes obesos e não obesos, foi baseada em dados observacionais, com o risco inerente de viés devido a fatores de confusão desconhecidos e não mensurados. A aparente menor mortalidade em pacientes obesos pode ser explicada pela idade geralmente mais jovem (já que o envelhecimento é, de fato, um fator que pode diminuir o peso corporal ao longo do tempo) e, portanto, pela menor prevalência de outras comorbidades relacionadas à idade que, per si, estão associadas a uma mortalidade mais alta, criando assim este aparente paradoxo. Essa mesma questão pode encobrir um sinal potencial para um aumento de sangramento (se existir) entre pacientes obesos. Se a obesidade fosse protetora contra a morte, não esperaríamos uma redução da mortalidade favorecendo a perda de peso em ECRs que testaram um medicamento para redução de peso, como a semaglutida subcutânea, entre pacientes com alto risco cardiovascular.

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Existe um Tamanho Único para Todos? – Refinando a Terapia Anticoagulante Parenteral de Acordo com o Peso Corporal

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