Arq. Bras. Cardiol. 2022; 119(2): 326-327
Manifestações Cardiovasculares Tardias da COVID-19 – Uma Ciência em Construção
Este Minieditorial é referido pelo Artigo de Pesquisa "Avaliação da Disfunção Endotelial em Casos de COVID-19 com Dilatação Fluxo-Mediada".
No início de 2020, o mundo enfrentou o aparecimento de uma nova pandemia, a Doença do Coronavírus 2019 (COVID-19), causada por um novo coronavírus (vírus SARS-CoV-2). Rapidamente descobrimos que, embora o trato respiratório fosse o principal alvo, muitos outros sistemas de orgãos também podiam ser afetados. As manifestações cardiovasculares (CV) da COVID-19 estão entre as mais comuns e temidas e podem se apresentar como lesão miocárdica, arritmias, síndromes coronarianas agudas, insuficiência cardíaca, disfunção vascular e doença tromboembólica. Tanto a doença cardiovascular preexistente quanto a comórbida bem como a presença concomitante de fatores de risco CV são indicadores de pior evolução e prognóstico da doença. Digno de nota, o envolvimento CV agudo é um forte preditor independente de mortalidade hospitalar por COVID-19. A interação entre a infecção e o sistema CV é ainda objeto de estudo mas, além da lesão celular directa pelo vírus, acredita-se que a ativação de vias inflamatórias desempenhe um papel fundamental. Uma descrição detalhada da fisiopatologia do envolvimento CV na COVID-19 está para além do âmbito deste comentário e foi amplamente abordado em outros trabalhos.
Sendo reconhecidas como comuns as desregulação cardíaca e vascular na fase aguda da infecção, as preocupações concentram-se agora nas anormalias CV residuais a longo prazo. Huang et al., relataram que mais da metade dos pacientes convalescentes com COVID-19 apresentavam sinais de inflamação miocárdica ou fibrose na ressonância magnética cardíaca (RMC). Na mesma linha, a meta-análise de Kim et al., mostrou que quase metade dos pacientes recuperados de COVID-19 apresentavam um ou mais resultados anormais de RMC. Da mesma forma, e sem surpresa, a infecção também pode induzir lesão vascular sustentada. À luz do tropismo do SARS-CoV-2 para células que expressam a enzima conversora de angiotensina 2 ligada à membrana, não é de admirar que o endotélio vascular seja um dos principais tecidos envolvidos na infecção. No entanto, os efeitos da infecção por COVID-19 no endotélio vascular e a interação complexa entre os dois ainda são pouco compreendidos. Na sua essência, a homeostase CV depende principalmente do papel do endotélio. Ele regula o tônus vascular, a adesão celular, a tromboresistência, a proliferação de células musculares lisas e, no final, a inflamação da parede do vaso. Sempre que o endotélio é ativado, resultando em disfunção endotelial, a sinalização celular muda de processos vasodilatadores mediados pelo oxido nítrico para processos redox vasoconstritores. Isso pode ocorrer como um fenômeno agudo transitório, com pouca ou nenhuma consequência, ou como uma ativação endotelial prejudicial sustentada, eventualmente levando a um meio pró-aterogênico e pró-trombótico.
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Palavras-chave: COVID-19/complicações; Dilatação Fluxo Mediada; Endotélio Vascular; Inflamação; Ultrassonografia/métodos
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